por Stephanie Wruck | Nov 10, 2021 | Novo artista
TERRITÓRIO
Juliana Matsumura é Brasileira que atualmente vive em Lisboa. Formou-se em Desenho na Escola Ar.Co, e frequentou a Graduação em Têxtil e Moda pela USP. A artista é membro do Risco Coletivo, um coletivo de práticas de desenho contemporâneo. O desenho é seu principal meio de expressão e para executá-lo apropria-se de diversas ferramentas como gravura, fotografia e pintura. A série aqui apresentada faz parte do seu trabalho “Memórias da Água”, que aborda o contato mais próximo com sua ascendência japonesa e sua trajetória de imigrante brasileira em terras lusitanas. A desconhecida qualidade de territórios estrangeiros é exposta através de tonalidades difusas como manchas escuras. As formas lembram memórias borradas que se fundem com as expectativas que vêm com o processo de migração. Juliana é capaz de arquitetar novos territórios onde o peso da ancestralidade e as novidades advindas de novas experiências estão simultaneamente presentes.
- Rios que levam a territórios compartilhados enquanto carregam memórias de uma ancestralidade perdida;
- O fluxo de água é responsável por alterar seu entorno.
por Stephanie Wruck | Nov 10, 2021 | Novo artista
Deslocamento
Natália Loyola é formada em Comunicação Social e Jornalismo e cursa mestrado em Antropologia – Culturas Visuais na Universidade Nova de Lisboa. A sua investigação centra-se no exercício de observação de locais onde circula, especialmente dentro de paisagens urbanas. Suas fotografias funcionam como uma construção imagética de marcadores territoriais de seu próprio processo migratório, todos vistos em suas interações com a própria cidade e seus habitantes. A percepção sensível de Natália parte de dualidades como: movimento vs. quietude; nômade vs. sedentário; real vs. imaginário e evoca uma sensação de familiaridade em relação aos temas de cada imagem. As obras apresentadas refletem o estudo da artista sobre o deslocamento como um exercício de crítica corporal. Natália vive em Almada e trabalha mundo afora.
- O caminhar como prática crítica corporal;
- O exercício de tornar lugar a partir do cotidiano;
- Mapear campos imaginários por meio da apropriação de espaços físicos.
por Stephanie Wruck | Out 31, 2021 | Eventos
Sábado, dia 20 de novembro, às 17h, teremos um bate-papo com Natália Loyola e Roberta Goldfarb sobre suas práticas individuais e trabalhos apresentados na exposição.
Junte-se a nós na Fábrica Braço de Prata!

por Stephanie Wruck | Out 31, 2021 | Eventos
O Coletivo Amarelo tem a honra de anunciar a sua exposição inaugural Entorno em Lisboa!
Inauguração: 13 de novembro na Fábrica Braço de Prata, a partir das 19h no segundo andar.
Esta é a primeira exposição física do coletivo após um ano trabalhando apenas digitalmente. A exposição marca o papel do Coletivo Amarelo no panorama cultural e artístico da cidade de Lisboa, apresentando o trabalho de artistas de várias partes do mundo.
Entorno apresenta o trabalho de sete artistas: Juliana Matsumura, Eduardo Dias, Osias André, Gabriela Albuquerque, Martim Meirelles, Natália Loyola e Roberta Goldfarb. As obras apresentadas desdobram uma série de diálogos tecidas por um fio condutor: nosso entorno.
A exposição explora como esses artistas usaram suas práticas para dissecar seus arredores tangíveis, dando aos espectadores a possibilidade de interagir com variações do mesmo conceito. As obras foram subdivididas em cinco subcategorias: observação, deslocamento, território, documentação e impermanência. Embora no ano de 2020 o mundo tenha mudado drasticamente os motores das operações humanas para uma vida essencialmente virtual, os ambientes “reais” que nos cercam ainda são os que mais influenciam nossas experiências. No centro da exposição estão as habilidades individuais dos artistas para abranger a fisicalidade de seus arredores dentro de um quadro. Cada obra é uma resposta ao plano visual que existiu em algum momento no tempo e no espaço, atravessando as suas próprias fronteiras disciplinares (pintura, fotografia e videoinstalação) de forma a aproximar o espectador de uma órbita partilhada.
Seja através da observação do tempo, do deslocamento do corpo e da identidade, da redescoberta de um território perdido, da documentação de experiências ou da impermanência da vida, as obras apresentadas servem como uma tentativa de construção de uma paisagem reflexiva da realidade.
SOBRE OS ARTISTAS:
Osias André
Osias André, natural de Moçambique, emigrou para Portugal há quatro anos onde ganhou três bolsas da escola de arte independente Ar.Co, instituição vocacionada para a experimentação e formação artística. Osias começou a pintar aos oito anos e iniciou sua carreira artística através da ilustração gráfica, produzindo uma coleção de livros. Para ele, a pintura requer uma digestão mais lenta e indireta. As pinturas aqui apresentadas estão ligadas às suas origens africanas, ao mesmo tempo que refletem a busca de identidade de Osias conduzida por meio de uma prática tradicional de ateliê europeu. Atualmente Osias vive e trabalha em Lisboa.

Juliana Matsumura
Juliana Matsumura é uma artista brasileira que atualmente vive e trabalha em Lisboa. Formou-se em Design pela Escola Ar.Co, e cursou a Graduação em Têxtil e Moda na Universidade de São Paulo. O artista também é membro do Risco Coletivo, coletivo de práticas de desenho contemporâneo. O desenho é central na sua prática, utilizando várias ferramentas como a gravura, a fotografia e a pintura. Atualmente Juliana vive e trabalha em Lisboa.

Natália Loyola
Natália Loyola é licenciada em Comunicação Social & Jornalismo e está também a terminar o mestrado em Antropologia – Culturas Visuais na Universidade Nova de Lisboa. A sua investigação centra-se sobretudo no exercício de observação dos lugares por onde circula, sobretudo nas paisagens urbanas. As fotografias de Natália são uma construção de marcadores territoriais imagéticos de seu próprio processo migratório, tudo visto a partir de suas interações com a própria cidade e seus habitantes. Natália atualmente vive e trabalha em Almada, Portugal.

Gabriela Albuquerque
Gabriela Albuquerque é uma artista brasileira, que trabalha e vive em Cascais. Sua pesquisa atual se concentra em paisagens e desenvolvimentos recorrentes além da tradição acadêmica histórica desse gênero. A repetição quase compulsiva de imagens procura exaltar o paradoxo entre a permanência e a impermanência do nosso meio, daquilo que nos é familiar, mas também efémero. A escolha da tinta a óleo como suporte, que segue uma tradição secular, questiona a continuidade de certas práticas que persistem apesar das constantes inovações. A obra de Gabriela tensiona a tradição da pintura a óleo no contexto da arte contemporânea.

Eduardo Dias
Eduardo Dias é biólogo de São Paulo, Brasil e atualmente trabalha na Universidade Presbiteriana Mackenzie como Técnico de Laboratório no Centro de Pesquisa em Biociências. Sua prática o leva a biomas brasileiros como o Pantanal, o Cerrado, a Mata Atlântica, entre outros destinos, e a fotografia desempenha um papel importante em suas viagens. Ele a utiliza como uma ferramenta para dar asas à sua imaginação, mas também como meio para criar um repertório didático em que seus conhecimentos de biologia se fundem com a arte.

Martim Meirelles
Martim Meirelles é um fotógrafo americano que vive e trabalha em Nova York. Descendente de portugueses, Martim transita entre os EUA, Portugal e Moçambique. A sua pesquisa fotográfica documenta vidas humanas que vivem à margem da prosperidade económica e partilham a mesma origem linguística portuguesa. Em seu trabalho, há um foco na beleza, na dor e na alegria, destacando a capacidade do artista de abordar cada assunto com uma profunda sensibilidade visual. As fotografias aqui apresentadas resultam de uma estadia de um ano no orfanato Madre Maria Clara em Moçambique em 2017 e também de uma residência artística na Nazaré em 2014.

Roberta Goldfarb
Roberta Goldfarb é uma artista brasileira que atualmente vive e trabalha em Lisboa. É graduada em Publicidade e Propaganda (FAAP, 2001) com ênfase em fotografia pelo Senac (São Paulo), La Escuela de la Imagen y el Diseño e Centre Cívic Pati Llimona (Barcelona) e International Centre of Photography (Nova Iorque). Sua pesquisa é impulsionada pelo desejo da artista de coletar e catalogar objetos físicos e experiências que, de outra forma, seriam perdidas nas memórias. Roberta constrói esferas de sentimentos e significados exibindo o que vê com os olhos. Entre as exposições de que participou, destacam-se “Dizer Fazer” (Ateliê RG, SP, 2014), “Enquanto Tempo” (Oficina Oswald de Andrade, SP, 2014), Clube dos Colecionadores (NowHere, Lisboa, 2020) e o mostra individual “Levantes, rajadas de vento ou os planos para ver o mundo” (Ateliê RG, SP, 2014) e “Preâmbulos para um Conto de Mundo” (Galeria Rabieh, SP, 2012). Atualmente participa da mostra coletiva “Pedágio de Mim – Foco Brasil” (Not a Museum, Lisboa).

Curadoria de Stephanie Wruck
Para receber o catálogo completo da exposição, envie-nos um email para: contact@coletivoamarelo.com
por Stephanie Wruck | Ago 19, 2021 | Artigo
Percepção:
efeito de perceber, de compreender o sentido de algo por meio de sentidos.
O ato de observar aquilo que nos rodeia ocorre todos os dias de forma automática e imediata, independentemente dos espaços que estamos inseridos; seja em um museu, dentro de casa ou andando pelas ruas da cidade. A partir dessas observações, é possível atribuir significados a determinadas situações e circunstâncias.
Partindo dessa ideia, quais são as vantagens em questionar nossos próprios processos de olhar para trabalhos artísticos?
O tema da vez é a percepção, contextualizada dentro dos mecanismos do olhar. O exercício de observar um trabalho de arte pode acontecer de inúmeras formas, gerando resultados diferentes sobre o próprio trabalho e também sobre o observador.
Nossa capacidade em atribuir significados a trabalhos artísticos pode se desenvolver de forma mais profunda quando nos encontramos atentos aos nossos próprios processos de observação. Qual é a diferença entre atribuir significados versus um entendimento genuíno e orgânico?
Existem imagens que funcionam como meio para dar sentido a situações e cenários, e outras que oferecem um entendimento automático sobre aquilo que não foi previamente mastigado para o nosso consumo. Nesse caso, qual seria o papel do observador em produzir significados para trabalhos de arte?
Nossas percepções também interferem na produção de nossas memórias, fundindo informações imagéticas e criando novas linguagens e significados. Sendo assim, nossos campos imaginários estão constantemente em transformação. É possível cultivar o nosso próprio mecanismo do olhar a se tornar mais profundo e significativo?
Durante as próximas semanas, iremos propor exercícios do olhar, investigar nossa relação com a maneira que enxergamos trabalhos de arte, e ilustrar o tema trazendo trabalhos de artistas que dialogam com esses questionamentos.
Imagem: Marco Tirelli
por Stephanie Wruck | Abr 30, 2021 | Artigo
Eduardo Politzer é um designer de som e artista brasileiro do Rio de Janeiro e hoje conversamos com ele sobre seu trabalho digital “Labirinto”.
Este é um convite para colocar os fones de ouvido, se perder, se redescobrir e, com sorte, sonhar. Politzer criou um novo espaço digital repleto de sons, memórias, sonhos, poemas e pensamentos soltos. Ao navegar pelo labirinto, clicando em hiperlinks que o redirecionam para diferentes cantos, você desenha seu próprio caminho. Às vezes, o labirinto pode ser profundamente comovente e pessoal, outras pode ser relaxante e divertido.
Tivemos a oportunidade de navegar com ele pelo labirinto de Eduardo, fazendo perguntas ao longo do caminho. Ele compartilhou conosco como foi o processo de criação da obra e o que aprendeu com a experiência.
“Put on your headphones.
Get lost, dream.
When you realize you’re in a labyrinth
it’s because you’ve been there for a long time.
But don’t rush,
Perhaps you will learn something along the way.
Maybe you’ll find something valuable,
Maybe you will learn something valuable about yourself,
Perhaps,
Maybe you’ll wake up with a feeling,
Perhaps your brain uses this time to simulate different situations.
To discard what is of little importance.
To prepare for something in the future.
In this labyrinth you will find characters and places,
Sound and image.
Time and thought.
Metaphysics and nonsense.
I’ll tell you my dreams
And then you tell me yours.
This is an ornament
A necklace that we place around the neck of time,
To see if it gets tamed.”
Convidamos você a explorar o labirinto por conta própria, acesse aqui. Clique aqui para visitar o site do Eduardo. Siga-o no IG: @eduardopolitzer
por Stephanie Wruck | Abr 26, 2021 | Artigo
No último ano, a pandemia da COVID-19 provocou um protagonismo inquestionável do trabalho em ambientes digitais. Assim como outros setores produtivos, o fazer artístico passou por diversas adaptações nesse período. Nós do Coletivo Amarelo propusemos nas últimas duas semanas uma investigação histórica das relações entre arte e Internet, sugerindo reflexões relacionadas às primeiras experimentações com tecnologia às intervenções do movimento NetArt nos anos 90, muitas vezes preditivas da performance de artistas em um mundo cada vez mais digitalizado. Os textos anteriores estão disponíveis em nosso blog sob a tag “Internet”. Clique aqui para ler nosso último post sobre o movimento Net.Art.
Nos primeiros meses de 2021 presenciamos o que parecia ser o estopim para uma nova era nas relações entre arte e internet. As edições do NFT invadiram as redes sociais e grupos de arte logo após a tradicional casa Christie’s leiloar uma obra de arte totalmente digital por US$ 69 milhões (ou R$ 382 milhões).

“Everydays: the first 5000 days“, do artista digital contemporâneo Beeple, arrecadou US$ 69 milhões no último leilão da Christie’s Auction House.
A obra é uma colagem das ilustrações diárias que o artista fez durante 5000 dias consecutivos (Imagem: Beeple/Christies disponível na BBC.com)
O que aconteceu? De onde veio? Isso é uma nova tendência?
Após quase duas décadas de especulação instável, as carteiras de criptomoedas, como o Bitcoin, dispararam especialmente no ano passado. O valor de apenas 1 Bitcoin saltou de US$ 0,34 em meados de 2010 para cerca de US$ 50.000 (ou aproximadamente R$ 280.000 – citação do Google: Morningstar e Coinbase, consulta 23/04/2021).
Porém, nem todo tipo de produto teve a mesma possibilidade de introdução no mercado de criptomoedas, isso porque o comércio monetário que acontece no mundo tecnológico passou a exigir uma estrutura mais segura, já que toda a transação é feita em uma moeda que não existe no o mundo real. O sistema online Blockchain foi criado a partir dessa necessidade. É uma plataforma que funciona como uma exchange de criptomoedas e serve para exploração, rastreamento, monitoramento e registro de transações complexas.
No Blockchain, cada comércio é codificado como um link imutável e, portanto, outros objetos que precisariam de valor não intercambiável em transações mais seguras agora foram introduzidos no comércio de criptomoedas, como obras de arte.
Mas o que significa “objetos com valores não intercambiáveis”? Imagine duas situações:
- Você está em uma loja e sua compra totalizou $ 100. Você tem a opção de pagar usando duas notas de $ 50, 5 notas de $ 20 ou 10 notas de $ 10, etc. Portanto, a moeda comum é mutuamente intercambiável (ou fungível).
- Digamos que você seja o proprietário de três casas localizadas na mesma rua, uma no valor de $ 500.000 e duas outras no valor de $ 250.000 cada. Embora seu preço seja próximo, se hipoteticamente as duas casas que valem $ 250.000 forem agrupadas, elas não necessariamente terão o mesmo valor estipulado da casa que vale $ 500.000, por mais que os valores unitários combinados resultem em um valor equivalente. Isso porque cada casa é única e tem características próprias, ou seja, possuem valores mutuamente não intercambiáveis (ou não fungíveis).
Nesse sentido, o Blockchain permite que objetos com valor não intercambiável sejam negociados por criptomoeda, mantendo um aspecto fundamental: a unicidade. Para isso, cada objeto será vinculado a um link imutável gravado no Blockchain. Esses links imutáveis são chamados de NFT (Non-fungible Token). Os NFTs também são capazes de sustentar outro aspecto essencial para o mercado de arte: o conceito de escassez, responsável por valorizar a peça levando em consideração quantas unidades idênticas a ela existem ou não. Além disso, os NFTs oferecem um novo tipo de cadastro para os artistas, uma vez que os links imutáveis registrados na Blockchain podem conter todas as informações e especificações técnicas da obra produzida em formato de “Contrato Inteligente”.
Em suma, a nova revolução no mundo e no mercado de arte permite que as obras sejam vendidas 100% digitalmente, formando um novo segmento: a Crypto Art. Cada arquivo de imagem, vídeo, som, texto ou software, mesmo que seja único ou de edição limitada, torna-se um NFT registrado na Blockchain. Como resultado, cada NFT será precificado e vendido em Criptomoeda.

Still do trabalho de vídeo NFT do designer gráfico americano Kii Arens baseado em uma casa real na Califórnia.
Os licitantes farão ofertas neste NFT, com o vencedor também recebendo a propriedade física na 221 Dryden Street.
Após este processo, a NFT tem um contrato rastreável com direitos autorais mais credíveis, seguros e inovadores. Por exemplo, até o surgimento da Crypto Art, um artista não recebia uma porcentagem do lucro correspondente à revenda de sua obra. Com o Smart Contract, uma cláusula pode vincular um percentual obrigatório de repasse ao autor da obra caso a NFT seja revendida. Noah David, especialista responsável pelo primeiro leilão de NFT realizado na Christie’s, declarou que “o potencial imposto pelos NFTs para romper com o modelo tradicional de leilões de arte é imenso”.
Ainda assim, eles ainda são arquivos digitais, então alguém pode tê-los? Teoricamente sim, na prática não, pois só quem possui o NFT é dono da obra. O legítimo proprietário será segurado no registro do Blockchain.
Vale lembrar que a Crypto Art é altamente influenciada pelos videogames (aliás, um nicho do design visual que recentemente ganhou o merecido posto de produção com conteúdo artístico). Em outras palavras, a aparência em destaque tem características futuristas que remetem até mesmo às intervenções preditivas do NetArt.

“Gods in Hi-Res”, do artista canadense Grimes. A obra tem visual futurista inspirado em games.
O NFT foi leiloado por $ 77.000 (Imagem: Grimes / Niftygateway)
Por fim, é neste contexto de congruência exercido por um ambiente tecnológico de infinitas possibilidades associado a uma situação global de protagonismo digital, que se instala uma nova era para a arte e a internet. A Crypto Art propõe uma reintegração da vanguarda dos anos 90. Uma reinicialização. Cabe a nós, artistas, refletirmos sobre nossos próprios conservadorismos em relação aos avanços da arte com a tecnologia. A Crypto Art se estabelece não apenas como uma tendência, mas como um movimento. É ingênuo acreditar na ilegitimidade do movimento apenas com base no fato de que essa arte “não existe” na vida real. Afinal, se o digital existe é porque nós o criamos, tornando-o parte da nossa realidade. Com isso, a arte cumpre seu papel catalisador de novas leituras dessas realidades.
REFERÊNCIAS:
Venda Extraordinária – BBC News Brasil
JPG File Sells For 69 Million – New York Times
NFT Artwork Being Sold With Physical House In California – Dezeen
por Stephanie Wruck | Abr 15, 2021 | Artigo
A Net.Art surgiu no início dos anos 1990, quando um grupo de artistas começou a explorar as possibilidades que a internet oferecia: desde a promoção de seus trabalhos até o uso de softwares e navegadores para criar novos trabalhos. Esses artistas rapidamente perceberam a importância da internet como ferramenta para redescobrir o valor intrínseco da arte, desvinculados dos mecanismos do mercado de arte, deslocando o foco do objeto para o processo.
Os trabalhos realizados nesse período ilustram o espírito dinâmico e colaborativo da internet dentro do processo criativo. A internet era um novo território no qual os artistas podiam explorar suas possibilidades de novidade que existiam além dos espaços físicos. Essa liberdade total dos intermediários colocados pelas instituições de arte sobre o trabalho do artista e a versatilidade da internet como meio, transformaram o movimento net.art em uma revolução. Desafiava a forma como a arte era feita, trocada, promovida e exibida.
OS ARTISTAS
Reunimos três notáveis artistas ligados ao movimento net.art, destacando a importância de seus trabalhos.
Olia Lialina
Pioneira no movimento net.art, Lialina é mais conhecida por sua obra de arte para navegadores “My Boyfriend Came Back From The War” de 1996. Ela consiste em vários hiperlinks de imagens e texto, todos em preto e branco, nos quais os espectadores pode navegar, clicando em diferentes partes da tela enquanto uma narrativa é desenvolvida. A história é sobre um casal que se reencontra após a guerra e sua dificuldade em se reconectar emocionalmente. Ela confessa um caso com o vizinho enquanto surge um pedido de casamento. Essa peça cinematográfica, granulada e semelhante a GIF influenciou muitos artistas posteriores que experimentaram navegadores e softwares. Visite a obra aqui.

Mouchette
Mouchette é o trabalho estabelecido pela primeira vez em 1996 pela artista de Amsterdã Martine Neddam. Ela convida o espectador a navegar por um labirinto de site HTML da vida turbulenta de uma adolescente lutando contra o suicídio e o trauma. A peça é sombria, mas bem-humorada e divertida, nos mantendo adivinhando o que pode acontecer a seguir. No momento em que a obra foi criada, os usuários encontraram instruções de onde encontrá-la por meio de um bot interativo, quizzes e e-mail. A participação do público foi uma parte central do trabalho, criando um espaço onde todos poderíamos fazer parte. Os usuários também puderam enviar seus próprios trabalhos de net art por meio do site da Mouchette. Visite a obra aqui.


Alexei Shulgin
A obra “Form Art” de Shulgin, de 1997, é outro arquivo importante da era net.art. Ele usou botões e caixas HTML para criar composições monocromáticas que serviam como um estudo dos mecanismos do próprio HTML. No entanto, “Form Art” tornou-se uma obra de arte mais lírica e abstrata, expondo o esqueleto da internet de uma forma nunca antes vista. Shulgin disse: “Colocá-los em foco foi uma declaração do fato de que um computador não é uma camada invisível “transparente” a ser dada como certa, mas algo que define a maneira como somos forçados a trabalhar e até pensar”. Visite a obra aqui.

Durante esse tempo, os artistas da net.art foram capazes de projetar um novo universo emocional, existindo paralelamente aos espaços emocionais físicos que habitamos, eventualmente se tornando a infraestrutura digital que navegamos hoje. A natureza híbrida da internet, onde todas as formas de arte têm um lugar para viver lado a lado – imagens, texto, vídeo, som, etc – impactou o cerne do processo de criação. Não havia mais separação entre onde você cria, colabora, projeta e promove; tudo aconteceu na internet. A ideia de que a internet poderia acomodar todos os aspectos do processo criativo influenciou tanto as próprias obras quanto a resposta do público a elas.

“Desktop Is“, Alexei Shulgin, 1997
Josephine Bosma, crítica e teórica especializada em arte no contexto da internet disse:
“Para colocar net.art na perspectiva certa, a história da arte deve ser parcialmente reescrita. Muita ênfase foi colocada no status de mercadoria das obras de arte durante este século. Inevitavelmente, essa tendência excluiu certas artes e artistas que não satisfazem critérios relacionados . Talvez net.art nos ofereça a oportunidade de repensar os critérios pelos quais a arte é valorizada. Claro, net.art não é um objeto facilmente perceptível. Muita arte na internet aparece muito dispersa devido ao uso de múltiplas mídias e transitoriedade. Para experimentá-la, é preciso ser um ávido seguidor da net.culture.”
A visão de Bosma sobre o impacto da qualidade do espaço da internet nas artes ainda hoje tem um valor incrível. O que ela chamou de net.culture em 1998 ressoa para todos nós – artistas e consumidores de arte – talvez mais do que nunca. À medida que circulamos por essa espessa manta de mídia nas plataformas sociais e na web como um todo, é inevitável nos perguntarmos para onde iremos a seguir. Talvez devêssemos seguir o conselho de Bosma e reescrever a história da arte.
Como categorizamos a arte no contexto da internet? Existe ainda a necessidade de categorizar diferentes formas de arte? Net.art tornou quase irrelevante distinguir o que é arte e o que não é. Por isso, Bosma concluiu que os artistas que não desejam descrever seu trabalho como arte podem evitar as discussões limitantes sobre a relevância e o valor de seu trabalho dentro de um “mercado de arte”. Como muitos artistas da net.art preferiram permanecer invisíveis, dissolvendo-se em suas obras efêmeras e temporárias da internet, Bosma nos deixou uma importante reflexão: afinal, a arte só lucra com essa obscuridade?

“Cyberfeminist Manifesto for the 21st Century“, VNS Matrix, 1991

“Brandon“, Shu Lea Cheang, 1998

“Mobile Image“, Kit Galloway, Sherrie Rabinowitz e colaboradores, 1975

“Summer“, Olia Lialina, 2013
Muita coisa mudou desde 1998, mas a internet continua sendo um lugar onde as paredes são constantemente derrubadas e construídas novamente. Novas linguagens visuais são escritas todos os dias, adicionando combustível à nossa vertiginosa experiência digital compartilhada, revelando mais sobre nós mesmos por meio de camadas editadas e impermanentes. Como a arte pode nos ajudar a entender os mecanismos em constante mudança da expressão criativa?
Afinal, a internet é nossa maior aliada na hora de fazer arte?
Referências: